‘O museu da inocência’

Capa do livro editado pela Companhia das Letras

Acabei de ler “O museu da inocência” (Companhia das Letras, 568 pgs.), do turco Orhan Pamuk, Prêmio Nobel de Literatura em 2006. Para quem gosta de saborear um livro com calma, sem pressa de chegar ao fim, absorvendo a narrativa de modo a aceitar a velocidade imposta pelo autor, é um prato cheio. A história de uma impressionante paixão vivida pelo protagonista, Kemal, um sujeito de trinta e poucos anos que está para se casar mas de repente começa a mergulhar num sentimento que o domina completamente, não poderia ser contada de outro modo que não fosse a passos lentos, com a paciência e a persistência dos amantes que não se atropelam nas carícias por causa do desejo de chegar ao clímax.

Geralmente não é fácil controlar nosso ímpeto, isso em vários sentidos. Muitas vezes mal saboreamos o prato que planejamos comer, não aproveitamos como deveríamos a véspera de uma festa importante, ficamos cegos para lances bonitos do futebol porque queremos desesperadamente que nosso time faça um gol logo e se possível o jogo acabe, e claro queremos tanto saciar nosso desejo sexual que acabamos eliminando etapas prazerosas do processo. “O museu...” é, além de tudo, um ensinamento para que nos contenhamos e saibamos aproveitar ao máximo cada segundo de nossas vidas.

Em meio às turbulências políticas da Turquia nos anos 1970 e 1980, Orhan Pamuk tece uma teia que aos poucos vai nos envolvendo numa história de amor daquelas que duram décadas, mas certamente poderiam levar séculos. Clique aqui para ler a sinopse do livro no site da Companhia das Letras. A narração contrapõe também as acentuadas diferenças culturais e comportamentais daquela Turquia, cujo atraso torna-se latente nas páginas de “O museu...”, e a Europa ocidental. Questões como a virgindade e os compromissos implícitos que a relação entre um homem e uma mulher sugere à sociedade são profusamente debatidas no decorrer da narrativa. O autor, embora deixe claro certa despolitização do protagonista, traça um mapa esclarecedor de seu país nos anos em que se passa o romance.

E é maravilhosa a maneira encontrada por Orhan Pamuk para contar essa história, atrelando ao seu desenrolar uma grande aula sobre a importância dos museus, da história, da memória de cada um para que a linha mestra de cada sociedade não se perca no vazio de sua própria desinformação. É através dos objetos manuseados por seu grande amor que Kemal encontra conforto e força para levar até o fim seus objetivos na busca da tão esperada conquista. Por fim, a lição de felicidade diante das coisas simples da vida, que comumente costumamos deixar de lado, é uma verdadeira poesia no meio de uma prosa que também vai nos conquistando aos poucos, sem pressa, até que nos encontremos completamente subjugados à maestria de um dos grandes escritores mundiais.

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