mendigo – Texto de Thiago Roque

Desprezado, o carinho começou a beber.

Vodca e uísque, cada um no seu copo, ora com gelo, ora do jeito que vinha.

Queria esquecer a dor de não ser mais lembrado, de não estar mais no toque dos apaixonados, no abraço dos amigos, no beijo das famílias.

Fora de moda, bradavam. Não acessava a internet, não tinha Orkut, não sabia o que é wireless…

No começo, pensou que três dias bêbados seriam suficientes.

Hoje, completam-se três anos.

Anestesiado, roupa rasgada, todo mijado, o carinho perambula pelas ruas.

Cara fechada, barba comprida, cabelo desgrenhado. Nem de longe lembra o galã que fazia sucesso entre os sentimentos.

Alguns ainda o reconhecem – e ele chora. Mas, via de regra, as pessoas passam batido pelo miserável.

Ele ainda sofre.

A bebida não é mais tão forte assim. A aguardente que divide com o esquecimento, colega de banco de praça, não consegue mais apagar as lembranças, que cortam cabeça e coração feito foice da morte.

Morte que ele abominava. Que, hoje, ele deseja.

E ela só espia de longe. E ri.

Ao carinho, resta mendigar: pão, água, atenção, sorriso.

Ele está sempre no farol da avenida principal. A caixa de doces na mão esquerda é só pra disfarçar.

O que ele quer mesmo é ver amor sincero. Uma fagulha que seja. Um beijo na testa.

Mas o sinal verde sempre abre muito depressa.

E-mail: roque.thiago@hotmail.com

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