Sobre Heróis e Tumbas – Texto de Dudu Oliva

Ernesto Sábato no romance Sobre Heróis e Tumbas(1961) mostra temas e dialéticas da identidade do povo argentino a partir de pressupostos dos movimentos de vanguarda e do surrealismo, que pretendiam romper com a arte burguesa.

Faz uma síntese sobre as reflexões da sociedade contemporânea da Argentina. Aprofunda ainda mais os temas apresentados no seu primeiro livro – O Túnel(1948): a incomunicabilidade dos indivíduos em plena overdose de luzes nas grandes avenidas, bares ou cafés, o conflito psicológico e metafísico do indivíduo em relação às regras da sociedade e os problemas sociais e políticos com a pobreza e a repressão da ditadura populista de Perón.

A narrativa tem três planos: a relação neurótica e amorosa de Martín e Alejandra, a história da Argentina e o Informe sobre os Cegos, que mostra a loucura, a metafísica e o mito do incesto no olhar obsessivo de Fernando Vidal Olmos. Neste plano se concentra o surrealismo.

O livro possui inúmeros técnicas literárias, as quais se sintetizam para mostrar que a identidade da Argentina é composta por vários olhares fragmentados que formam um mosaico.

No caso do mito do incesto no olhar obsessivo de Fernando Vidal Olmos, este capítulo é fundamental para a compreensão da história. Porém, se o retirarmos e o colocarmos no início ou no final, a estrutura da história não fica sem nexo. É diferente de outros livros que possuem uma linearidade e um modelo convencional: começo, meio e fim.

A personagem Alejandra tem nove letras como Argentina, há uma relação
metafísica diabólica entre a moça e o país. Martin tenta em vão
atravessar o túnel escuro, onde Alejandra se oculta. Ela é a princesa-dragão. Ao mesmo tempo em que se aproxima de Martín, ela o rejeita.

Sua memória está composta de fragmentos de existência, estáticos e eternos: o tempo não passa, com efeito, entre eles, e coisas que aconteceram em épocas muito distantes entre si estão juntas umas às outras, vinculadas ou reunidas por estranhas antipatias e simpatias. Ou talvez saíam à superfície da consciência unidas por vínculos absurdos mas poderosos, como uma canção, uma piada ou um ódio em comum. Como agora, para ela, o fio que as une e que as vai fazendo sair uma depois da outra é certo a fúria na busca de algo absoluto, certa perplexidade, a que une palavras com pai, Deus, praia, pecado, pureza, mar, morte.
(Sábato: 50)

E-mail: dudu.oliva@uol.com.br

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