Fôlego sertanejo – Texto de João Pedro Feza

Travessia do tempo

Importa dizer: Dino Franco, ícone da música sertaneja – considerado por muitos o maior autor vivo do gênero com 1.500 canções compostas e mais de 50 discos lançados – completou 69 anos neste 8 de setembro de 2005. Ou, como prefere dizer, abriu contagem regressiva (e implacável) rumo aos 70 anos – mais de 50 de carreira artística. Injusto passar em branco.

Nascido em 1936 em Paranapanema, interior paulista, Walter (Dino) Franco não demonstra inquietação com o relógio da vida e os imprevistos da saúde: em Rancharia, onde vive após longa e produtiva jornada em São Paulo, chama a própria diabetes de “betinha” e prepara mais essa travessia do tempo com discrição e serenidade. O autor de clássicos como “Cheiro de Relva” (com Zé Fortuna), “Amargurado” (com Tião Carreiro) e “Travessia do Araguaia” (com Zé Carreiro) falou ao site dias atrás. Por telefone mesmo: “Aqui fala o Dino!”. Prosa boa – ora crítica, ora resignada, mas sempre lúcida, inteligente e inspiradora.

É uma honra falar com o senhor… Obrigado. É verdade que o senhor tem mais de mil músicas compostas?

Umas mil e quinhentas. Componho desde moleque, desde 1949. Mas meu primeiro disco só saiu em 1959, gravado com o Tibagi em sistema de 78 rotações. Trazia as canções “Peão de Minas” e “Falsos Carinhos”. Éramos Tibagi e Pirassununga. Antes, já havia formado a dulpa Osvaldinho (Dino Franco) e Orlandinho...

Aliás, o senhor fez parte de várias duplas. Fale delas...
Ah, teve Juquinha e Junqueira - eu era o Junqueira. Também fiz dupla com o Belmonte, éramos Belmonte e Pirassununga. Recebíamos, à época, grande influência do trio mexicano Los Panchos e do cancioneiro gaúcho. Também existiu a dupla Dino Franco e Zé Fortuna, o grande Zé Fortuna. Fiz muito circo, muito palco... Depois vieram Biá e Dino Franco e Dino Franco e Moraí, que foram as duplas mais conhecidas na carreira fonográfica.

Do seu vasto repertório, qual a música favorita?
A que eu ainda não fiz. (risos) Mas deve ter alguma...São todas muito queridas. Tem algumas perdidas no tempo, que a gente fica feliz de fazer, mas que nem chega ao grande público. Fica mais para a família e os amigos. E tem os sucessos como "Cheiro de Relva" (parceria com Zé Fortuna) e "Travessia do Araguaia" (com Zé Carreiro), "Amargurado" (com Tião Carreiro), "Pombinha Branca" (com Belmonte), "A Sementinha" (com Itapuã), também gravada por Liu e Léo.

Sente saudades do que chamam "fase áurea"?
Não ligo para esse negócio de auge na carreira. Não ligo, não. Tive ótimos parceiros e consegui algum destaque, é verdade. Nos anos 60, um programa na Rádio Tupi que cheguei a apresentar recebia milhares de cartas por dia. Era uma loucura. Tinha um menino, tipo um boy, que vivia da rádio para o correio, do correio para a rádio. Mas é bom ficar tranqüilo também. Afinal, vivi a correria de São Paulo entre as décadas de 50 e 90 (1956 a 92). Agora, estou com a minha vidinha aqui em Rancharia e já faz um bom tempo isso.

Como o senhor avalia a atual música sertaneja?
Olha, cada um faz o seu e na sua época. Na minha, além das modas de viola, a gente tinha forte influência da música paraguaia, da música mexicana, como eu já disse. E tinha o bolero... Mas a gente nunca deixou de fazer música sertaneja e com muito respeito, orgulho e alegria. Só acho que isso, quer dizer, essas músicas, essas duplas, algumas duplas, que são tão famosas que nem preciso citar nomes, fazem outra coisa, outro gênero. Rapaz, é só amor, amor, amor... Você pega o disco, ouve uma música e nem precisa ouvir as outras. É tudo igual!

O senhor diria que a nova geração se apropriou indevidamente do título "sertanejo"?
O que fazem é outra música, precisa dar outro nome. Não é música sertaneja. Fazem música brega. Basicamente, brega. Mas tudo bem, não tenho nada contra ninguém. O tempo passa e tudo se modifica, não é mesmo? Só acho que foi uma mudança muito radical. Passou da conta.

O que achou do retorno de Rolando Boldrin à tevê?
Rapaz, nem vi o programa ainda. Aliás, na televisão, só assisto ao jornalismo e ao futebol.

Mas nem "Viola Minha Viola"?
Fui homenageado lá esses dias. Acabei nem vendo o programa.

O senhor falou de futebol. Torce para quem?
Sou co-rin-ti-ano!

E a saúde, como vai?
Tudo bem, tudo bem. Tenho uma diabetes que chamo de "betinha", mas está tudo bem.

Meu pai, lá de Ourinhos, é seu fã...
Manda um abraço pra ele, viu? Fala que mandei um abração.

Reclame
O CD "Dino Franco - 50 Anos de Carreira" pode ser encomendado pelo site da gravadora Atração: www.atracao.com.br. Ou nos armazéns de Rancharia, onde o pessoal costuma ouvir música boa.

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