“Cardeneta” e Arizona solto – Texto de João Pedro Feza

O André Balieiro lembra disso tudo e muito mais…

Naquele tempo…
Uma vez desdobrou-se e comprou um kichute, o caderno de capa dura ficou para outro mês. Se Desenhocop era impensável, pelo menos as folhas de seda quebravam o galho. Outra vez assistiu Perdidos no Espaço e se intrigou com o jeito do Dr. Smith. “Nationaro Kido” era o herói. Monareta dava briga com o colega de cobranças imobiliárias, até chegarem a um acordo para pedalar nos fins de semana.

Ovomaltine é que dava energia e Light era palavra intraduzível. Ditadura lembrava cozinheira grandona, a "cardeneta" funcionava no barzinho... De vez em quando ganhava um extra reservando banco no trem que vinha de Garça, fumando Arizona (comprado solto). Mais uma vez assistiu Terra dos Gigantes, ficou desatento e espalhou "mertiolate" pelo asfalto. Água oxigenada, mercúrio cromo e "pó-patapataio" era a receita. E funcionava.

A televisão era Telefunken RQ (vinha com reserva de qualidade), o sofá já rangia, guardava-se tudo (ou quase tudo?) na peçona, o beliche era "pros mano" e as sandálias havaianas não tinham cheiro nem soltavam as tiras. Bom mesmo era guaraná Antarctica caçulinha e sanduíche de mortadela. Havia menos mendigos, a Lili era uma cadela bonita e circo, Orlando Orfei. Mato Grosso era o paraíso (Oncinha a pinga), lelé da cuca o desajustado, OVNI prato de louça e o Seu Caneca, o professor pardal.

Quadrinhos era gibi, gostosa a moça da Capitão e escamoso o filho do dentista. E os milicos cheiravam as mãos dos suspeitos, mas the best mesmo era o Patchuli.

Turvas foram as Águas Claras, grande era o quintal, a Rodoviária na Machado de Melo e a Vila Independência uma aventura!

Alta era a escada de trocar lâmpadas da Estação Ferroviária. Pato fugia, porco engordava, gabiroba tinha no caminho do aeroporto, quando se ia ver a Esquadrilha da Fumaça no aniversário da cidade.

Festa de casamento só com churrasco, embaixo de lona, e bolo da festa, no café da manhã, só uma vez na vida. Formigueiro era a zona. Terror, o Zé do Caixão. E o Ponciano do Juizado de Menores.

De noite, atravessar a pinguela era perigoso. E a Monsenhor terminava num subidão, de terra, numa casa chique.

Quem tinha cara grande não cuspia pra cima, brincadeira era a dançante e a equipe, de som e luz. Gol era de placa, rádio de válvula, e pra se chegar em Boracéia só de jipe, com o seu Adauto, pai do Douglas, que moravam no único sobrado do quarteirão.

DKV socorria, e pra ir ao Country Clube só de Gordini. Fiscal era pessoa, Américo o açougueiro e Sesi a escola.

Dinheiro era vermelho e todo ladrão pulava muro. Hino? O do Instituto, aula Artes Industriais, leite o de saquinho e artesanato o de crochê.

Barnabé não era cantor, Paulista não era loteria, professor não era tio, Científico não era curso e ecologia lembrava acústica.

Ninguém morava na filosofia. Se Maomé não ia à montanha, ia à praia, e quem dava aos pobres (pobres biscates), pagava a conta da pensão, apesar de haver vagas para moças de fino trato.

Ator só com voz de ouro, prata e bronze. A guerra do Paraguai foi sangrenta, milagre só com o papa e general, mas peido mesmo era com o Tio Duílio. Preto era preto, branco era branco, loiras bonitas e não existiam ruivas.

Estupro era "estrupo" e ninguém sabe quem matou Mara Lúcia. As Leilas já se sabe. Sorvete era o de Itu e propaganda era reclame.

Pioneiro era Baden Powell (sempre alerta) e bom mesmo era o datilógrafo. Herói mesmo era o bombeiro, filho da puta também era lazarento, a mãe era da rua, brincadeira de médico era particular e Babel era a torre.

Sete era conta de mentiroso, Biboca era bar e todo mundo era feliz pra sempre.
Alguém se lembra?

(Texto original gentilmente cedido por André Balieiro, morador - e "lembrador" - em Bauru)

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