Proseando contra a maré – Texto de João Pedro Feza

Que uma parte da classe política sempre foi econômica em bons exemplos, não é novidade. Só não precisava exagerar. Por volta dos oito anos, ouvi que “político é tudo safado”. Discordo. Generalizações têm inspiração nazista, o que pressupõe a condecoração moral de poucos apadrinhados e o apedrejamento da maioria “impura”. Ocorre que quando um (apenas um) parlamentar entende que a tal coisa pública é de ninguém (quando, na verdade, é pública porque é de qualquer cidadão), então voltamos à estaca zero no quesito moralidade. Já no quesito alegoria...

Quando vários políticos, de uma só vez, começam a ser desconstruídos por seus próprios pares - que, nos bastidores, arquitetam flagrantes, gravações e apreensões -, a máscara cai em nossos pés. Fossem pródigos os políticos em bons exemplos, teríamos uma sociedade sem "jeitinhos" - apelido carinhoso para justificar delitos "aceitáveis". A coisa chegou a tal ponto que, nesse momento, há um nobre deputado (são tantos, escapa-me o nome) que vem utilizando a televisão, em peças partidárias, para afirmar: "A corrupção chegou a um nível insuportável". Quer dizer que havia, antes, um "nível suportável de corrupção"?

Parênteses: as nossas simpáticas mazelas criam leis que não pegam - e assim vamos consolidando a nossa, às vezes, anedótica democracia.
Talvez a corrupção seja, sim, suportável enquanto prática obscura. Às claras, a corrupção cega - como o brilho dourado do poder.

Excelentíssimos: façam da crise um divisor de águas - limpas, não turvas. Comecem por estancar a sangria do tempo de tevê com patéticos discursos personalistas. Acabem, para ontem, com essa história de ilustrar programas políticos com as belezas naturais do Brasil. Não é mais possível aceitar aquela panorâmica do Viaduto do Chá como exemplo da pujança paulistana!

Um outro líder deposto, dias atrás, saiu dizendo que "deixa o cargo com as mãos limpas". Já estamos calejados dessa retórica. E precisa dizer que tem as mãos limpas? Não é o mínimo que esperamos de qualquer político - na entrada ou na saída? Ainda acreditamos, contudo, que não são todas as mãos que carregam malas de dinheiro para lá e para cá. O que não pode é virar moda essa "dança da malinha". "Malafrários" insones: vocês estão ditando uma moda perigosa. Se a dança pega...

Caso nada realmente mude, das duas, uma: ou teremos o retorno de forças ultra-conservadoras (e que sempre trabalharam com competência na acolhedora escuridão) ou de extremistas afoitos por um holofote a fim de difundir suas incendiárias profecias. Aproveitem, excelentíssimos, aquela propaganda do "bom exemplo". Façam a lição de casa, mas sem colar. Caso contrário, sei não: corremos o risco de ver o país de todos se transformar em terra de ninguém.

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