medo

sabe um cara fodão? este é o medo.

sempre fez sucesso com as mulheres. namorou a confiança, foi capaz de dar um fora na alegria (cara, quem em sã consciência dispensaria a alegria?) e dizem por aí que ele comeu a coragem de jeito – ela não teve tempo nem de tirar o salto alto…

fora isso, medo sempre foi bonitão, corpo malhado, roupa da moda, descolado – dica de um bom som, de uma boa balada e até de uma viagem para as férias? fale com ele.

as mulheres pagam pau para o medo. os homens pagam pau para o medo. as bichinhas, então… se bobear, sua mãe gosta mais dele do que de você.

medo é o cara.

mas, qual é o segredo do medo?

acredite: medo se dá bem na vida porque ele não sabe dançar.

é isso mesmo.

começou naqueles bailinhos nos quais os meninos, adolescentes em busca de sua primeira espinha, seu primeiro fio de barba e, claro, primeira trepada, faziam fila para tirar as meninas para dançar.

medo ficava sempre por último. ele não dominava a arte do dois pra lá, dois pra cá, mão na cintura ou mão no ombro, pés invisíveis para não esmagar o pisante alheio.

muitas vezes, medo fugia. muitas vezes, nem ia.

chorava na cama feito uma garotinha, abraçando o travesseiro como confidente e melhor amigo.

cresceu. nas baladas, era seguir o ritmo com as mãos no bolso e o pé direito marcando a batida. o visual nerd fazia o resto.

um derrotado, cara.

mas medo não queria ser um derrotado, que não mija em banheiro público ou desconhece cantadas prontas de nível pedreiro para falar para mulheres desconhecidas.

uma bela tarde, chegou em casa cedo com trocentos discos a tiracolo. bowie a tears for fears. living colour a the cure. rolling stones a peter gabriel.

ele não confirma, mas falam também em cindy lauper.

sofá de um lado, mesa de centro de outro, bibelôs de anjo (uma mania da mãe) escondidos.

cortinas cerradas, telefone fora do gancho, respiração ofegante.

não tinha mais volta. e não teve.

play. volume máximo.

cara, medo dançou. de forma ridícula, claro.

os braços balançavam feito uma aranha epilética. ele pulava tanto que parecia viver numa cama elástica. e os pés? meu deus, os pés...

sofrível. na escola arnaldo antunes de dança, medo seria reprovado e expulso. baixo nível.

mas sabe do melhor? medo ria. gargalhava. aprendeu a se divertir com seu jeito patético de rebolar, com sua coordenação de um troglodita bêbado, com sua não-dança.

agora, que ele sabia rir de si mesmo, por que não poderia rir dos outros?

é isso que ele faz hoje. ri de mim, de você, até da sua mãe, que gosta tanto dele.

o segredo do medo? é isso: ele não sabe dançar.

mas ri como ninguém.

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