A guerra e a poesia


Incessantemente, ininterruptamente, a água tombava sobre as casas, sobre o Largo deserto. Um ou outro urubu que ficava em riba da cumeeira ou alguns bem-te-vis que davam seus mergulhos, pegando as mariposas voejantes sobre os cupins. Nem almas-de-gato piavam. A erva crescia com viço extraordinário. Há poucos dias, quase não se notava o mato que chegava agora a esconder um boi. O caruru-de-porco, o fedegoso brabo, a erva-de-santa-maria cresciam com uma pujança de feitiço. Havia no ar um cheiro de verde, de coisa apodrecida, de semente germinando.
(Trecho de ”O Tronco”, livro de Bernardo Élis, José Olympio Editora, edição de 2003)

Bernardo Élis, romancista de escrita ímpar, muitas vezes comparado a Guimarães Rosa em seu estilo cru e regionalista, escreveu um dos livros que eu mais gosto. “O Tronco”, cujo enredo chafurda no violento ambiente dos coronéis do centro do Brasil, é uma incrível odisseia que nos leva, paradoxalmente e simultaneamente, à guerra e à poesia.

Eu recomendo para quem gosta de livros ambientados nos confins do Brasil e, quem sabe, nos confins do tempo. E mais que isso: nos confins de nossas almas.

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