Vozeirão

Morreu Moacyr Amaral! Absurdamente, eu não soube. Foi em agosto do ano passado. Sete meses atrás! É quase inacreditável que pessoas com as quais você trabalhou e conviveu durante certo período morram e você não tome conhecimento.

Na Lins Rádio Clube, começo dos anos de 1990, Moacyr era o diretor da emissora. Eu chefiava o jornalismo. O vozeirão do Moacyr era uma de suas marcas registradas. Ao abir o jornal às 12 horas, ele cravava “Meeeeeeiiiiiioooooooooodiiiaaaaaaaaaá”. Era sensacional. Tinha gente que nem se interessava pelas notícias, mas ouvia pelo menos a abertura do noticioso só para curtir as invenções do Moacyr.

Mas ele não era apenas voz. Também era coração. Trabalhava pra valer. Acreditava no que fazia. Não tinha medo de cara feia. Fazia suas críticas, mas estava sempre aberto ao diálogo. Parecia ser, mas não era o dono da verdade. Era apenas um garimpador da verdade.

Nos últimos anos, ele mantinha, com o radialista Edson Carlos Secco, o jornal “Debate”, na mesma Lins onde ele marcou época. Uma época romântica que já vai se esgotando com o fim daqueles que souberam mantê-la graciosa e atraente.

História de rádio

Nessa mesma Lins Rádio Clube, havia um apresentador de programa sertanejo chamado Jota Marques. Era um sujeito baixinho, bigodudo, de cabelos pretos lisos que ele mantinha razoavelmente compridos e penteados como um ator de novela mexicana. Simpático e boa praça.
Todo fim de tarde ele ia ao ar para atender aos pedidos de ouvintes.

Num certo período, criei um ouvinte fictício. Chamava-se Elenildo Madeira e todo santo dia ligava (da própria redação da rádio) para o Jota com histórias malucas que aconteciam com ele. Uma pescaria onde um jacaré mordera-lhe a bunda e coisas do tipo. Também costumava falar de receitas mirabolantes que ele inventava, tipo uma fritada de ovos que levava cachaça.

O curioso é que o apresentador foi se afeiçoando ao Elenildo Madeira, ouvinte que ele julgava realmente existir. Havia dias em que, de propósito, eu não fazia a ligação só para ver a reação do Jota. E nessas ocasiões, ele sempre comentava em tom de lamento a ausência do amigo Elenildo. O papo entre os dois passou a fazer parte do programa. A ficção foi se espalhando entre o pessoal da rádio. Virou atração. Todo mundo parava para ouvir a conversa que ia ao ar. Só o Jota não sabia. E nunca soube. O Jota já morreu. O Elenildo Madeira também.

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